Diante de projetos de leis de deputados federais que agridem os menos favorecidos e retrocedem os avanços da democracia brasileira e as conquistas da classe trabalhadora, nos questionamos: o Congresso Nacional está a serviço de quem?

De acordo com um estudo realizado pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), a radiografia do atual Congresso mostra quais os partidos ganharam e perderam na disputa das cadeiras e identifica os parlamentares com potencial para exercer influência no processo decisório do País.

A eleição de boa parte de deputados federais e senadores referendou um Congresso conservador com vistas ao social, liberal no que se refere ao poder econômico (empresarial) e atrasado em questões ambientais e direitos humanos. Foi criado um cenário de moralismo justiceiro, com a combinação de fatores entre Congresso financiado; governo impedido de administrar; Judiciário rendido aos veículos de comunicação e imprensa tendenciosa e manipuladora.

Segundo o estudo do DIAP, dos 32 partidos existentes no País, 28 são representados na Câmara dos Deputados, mantendo entre si posições que ocupavam no passado. Outros, no entanto, registraram queda para o lamento da classe trabalhadora, já que a diminuição foi registrada justamente na “bancada sindical” de 83 para 46 deputados com a seguinte composição: 29 deputados do PT, quatro do PCdoB, quatro do PSDB , três do PSB, dois do PSOL, dois do Solidariedade, um do  PV e um do PRB.

Os custos de campanha da última eleição foram determinantes para a redução da bancada dos trabalhadores e dos movimentos sociais e consequentemente para o crescimento das forças vinculadas ao mercado e ao setor empresarial, inclusive no ramo do agronegócio.

De acordo com o jornal “O Estado de São Paulo”, do dia 07/12/14 – “As empresas que mais doaram para campanha elegeram 70% da Câmara”. A reportagem cita que sete de cada 10 deputados federais eleitos receberam recursos das 10 empresas que mais fizeram doações eleitorais. Elas contribuíram financeiramente para a eleição de 360 dos 513 deputados eleitos”.  Segundo dados da matéria os maiores financiadores são: JBS (frigoríficos) elegeu 162 deputados investindo R$ 61,2 milhões; Bradesco - R$ 20,3 milhões com 113 deputados eleitos; Itaú investiu R$ 6,5 milhões e conseguiu eleger 84 deputados, além das empreiteiras, OAS, Andrade Gutierrez, Odebrecht, UTC Engenharia e Queiroz Galvão.

Diante deste quadro fica claro e evidente constatar que, boa parte dos políticos, está  defendendo os interesses daqueles que detém o poder econômico para influenciar os patrocinados a criarem leis que defendam, protejam e aumentem seu capital.

Outro jornal que também informa sobre o assunto é o “Brasil de Fato” do dia 18/08/15, que  segundo matéria publicada, a Bradesco Saúde está entre as empresas que mais financiaram a campanha de deputados fiéis aos objetivos do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, em votações emblemáticas como terceirizações, financiamentos de campanha e maioridade penal. Foram mais de R$ 4 milhões distribuídos entre 11 partidos, sendo que metade deste valor foi para o PSDB (R$ 1,2 milhão) e PMDB (R$ 820,9 mil), partido de Cunha, que desta fatia abocanhou R$ 250 mil.

Quem acompanha os trabalhos da casa, observa que o presidente da Câmara tem colocado em pauta uma série de medidas que, para a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), enfraquecem o Sistema Único de Saúde (SUS) e dão mais força aos planos privados.

A reportagem cita que entre as iniciativas que privilegiam os empresários do setor, está a Medida Provisória (MP) 627, da qual Cunha foi relator. O texto tratava de alterações na tributação dos lucros obtidos por multinacionais brasileiras. O deputado inseriu na MP um artigo que estabelecia redução do valor das multas que planos de saúde deveriam pagar no descumprimento de contratos com seus clientes, ou seja, uma medida totalmente partidária ao seu financiador de campanha.

De acordo com o Ministério da Saúde, caso a emenda fosse aprovada, as operadoras privadas que descumprem obrigações contratuais e legais receberiam um perdão de cerca de R$ 2 bilhões. O artigo, no entanto, foi vetado pela presidenta Dilma Rouseff.

Outro exemplo de favorecimento foi  o veto para instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito “dos planos de saúde”, proposta pelo deputado Ivan Valente (PSOL-SP). Valente obteve as assinaturas necessárias para a instalação da CPI , mas a criação foi barrada por Cunha, que alegou “falta de foco”.

Segundo Ivan Valente, “a decisão do presidente da casa em barrar a instauração da CPI dos Planos de Saúde foi meramente política, uma vez que todos os requisitos para justificar uma investigação foram cumpridos”. Ele afirmou ainda que a CPI deveria discutir, entre os temas, “a influência dos planos de saúde na política”.

Outros deputados que também defendem os patrocinadores são os ligados à bancada BBB (Boi, Bíblia e Bala), como foi batizada pela deputada Erika Kokay (PT).  A participação desses parlamentares no plenário dominou muitas sessões com interesses específicos de seus agentes financiadores, representados por ruralistas, evangélicos e delegados. Redução da maioridade penal, demarcações de terras indígenas, estatuto do desarmamento, estatuto da família, elevação da pena para crimes cometidos contra policiais e militares, estatuto do nascituro, criminalização da heterofobia , aborto como crime hediondo e dia do orgulho hétero foram temas de especial interesse dos patrocinadores da bancada BBB.

De acordo com André Luís dos Santos, assessor parlamentar do DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), a bancada de deputados BBB é muito atuante e “dispõe de 40% dos votos da Câmara, mas são capazes de formar maioria com tranquilidade, não tendo dificuldade para angariar apoio de outros blocos, até por ocuparem postos-chave na estrutura de poder da Casa, negociando cargos e favores”. Segundo André Luís, eles contam com apoio do PSDB, DEM, PSD, PRB, Solidariedade, PSC e parte do PMDB.

Nessa frente conservadora, a ala mais numerosa é a ruralista, formada por 109 deputados e 17 senadores.

Boa parcela destes políticos foi financiada por mineradoras, bancos privados, seguradoras e corporações. Os dados são públicos e constam na página virtual do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Os projetos polêmicos em pauta são: Demarcações das Terras Indígenas, Terras Quilombolas, Unidades de Conservação ambiental, Código da Mineração e Recursos Genéticos.  No topo das prioridades está a PEC 215 aprovada em comissão especial na Câmara em outubro do ano passado, retirando do Executivo a exclusividade de demarcar as terras dos índios e transferindo a palavra final ao poder Legislativo, o que acarretará ameaças aos direitos indígenas, já que os deputados estão a mando de seus financiadores de campanha.

Outra questão polêmica na pauta do Congresso é o Código da Mineração, que substitui o Código em vigor, de 1967. A principal mudança é a determinação do Executivo de licitar as áreas de mineração. O Código gerou "filhotes" como o projeto do deputado reeleito Vinícius Gurgel (PR-Amapá) que permite mineração em 10% das Unidades de Conservação de uso restrito, isto é, parques nacionais, estações ecológicas e reservas biológicas.

Já a Bancada da Bíblia, que ocupa a segunda posição, aumentou de 73 para 75 o número de deputados eleitos, além de preservar três senadores, como é o caso do pastor Marco Feliciano (PSC), que é referência para os evangélicos. Mas é novamente o peemedebista Eduardo Cunha, fiel da igreja “Sara Nossa Terra”, quem ocupa um lugar de destaque no Congresso, por definir o que entra ou não na pauta da Câmara, mesmo com a possibilidade de cassação de mandato que se arrasta na casa há cerca de sete meses.

Eduardo Cunha

Trajetória do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB/RJ)

Envolvido em diversos escândalos de corrupção, o deputado trabalha contra os direitos dos trabalhadores, das mulheres e dos gays.
• 1992: Denúncias de ilegalidades que envolviam o tesoureiro da campanha de Fernando Collor de Mello, PC Farias, apontavam que Eduardo Cunha era um dos principais captadores de dinheiro para a campanha do então candidato. Em 1991 ao assumir a presidência do Brasil, Collor nomeou Cunha como presidente da TELERJ. Ele foi retirado do cargo no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso por “trapalhadas administrativas” e corrupção.
• Em 2000, Eduardo Cunha deixou a Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro, alguns meses depois de assumir o comando da Empresa, sob acusações de fraudar licitações para favorecer a construtora de um amigo de partido durante o governo de Anthony Garotinho. O advogado do deputado usou documentos falsos para livrá-lo da acusação de fraude nas licitações.
• Em 2002, a falsa documentação também foi utilizada para arquivar uma investigação contra Cunha no Tribunal de Contas do Rio de Janeiro. O Ministério Público Federal percebeu um complô entre o subprocurador de Justiça Elio Fischberg, Eduardo Cunha e o advogado Jaime Cukier. Os três viraram réus na Justiça e somente Fischberg foi condenado.
• Eduardo Cunha também estava envolvido em um esquema de corrupção que resultou num rombo de R$ 850 milhões em impostos. O caso aconteceu entre 2002 e 2006 quando uma CPI apurou um esquema de venda de combustíveis sem o recolhimento de impostos no Rio de Janeiro. Cunha participava do esquema e teve vários contatos confirmados com Ricardo Magro, dono da refinaria de Manguinhos, apontado como um dos principais cabeças da fraude.
• Em 2005 Eduardo Cunha foi ligado a denúncias de desvio de recursos do Mensalão. Ele estava envolvido com desvio de recursos do fundo de pensão da Companhia de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro, no repasse de dinheiro público a partidos políticos.
• Em 2007 a deputada estadual Cidinha Campos (PDT-RJ) acusou Cunha de ter vendido um imóvel em Angra dos Reis por US$ 800 mil ao traficante de drogas Juan Carlos Abadia, preso no mesmo ano. Cunha teria comprado o imóvel de volta por US$ 700 mil. 
• Em 2010 Eduardo Cunha foi retirado da relatoria do anteprojeto do Código de Processo Civil (CPC) por influência direta da Ordem dos Advogados do Brasil. Para se vingar da entidade, em 2011, Cunha propôs projetos na Câmara Federal para acabar com o exame da OAB.

• Eduardo Cunha indicou o deputado Arthur Lira (PP-AL) para presidir a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Enquadrado na Lei Maria da Penha, Arthur Lira é acusado de agredir fisicamente a companheira dele, Jullyene Cristine Santos Lins em 2006. O caso foi denunciado em 2012 e, em 2013, o deputado tornou-se réu no Supremo Tribunal Federal. Além de tapas e socos, Jullyene disse em depoimento que foi arrastada pelos cabelos e chutada enquanto estava no chão.

• 2016 - Por dez votos a zero, o STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu o julgamento que decidiu pela abertura de processo criminal contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Com a decisão, Cunha passa a ser o primeiro parlamentar no exercício do mandato a se tornar réu a partir das investigações da Operação Lava Jato, que apura um esquema de corrupção na Petrobras.

 

E para finalizar, completam o time BBB, 22 deputados da “Bancada da Bala”, defensores da redução da maioridade penal, do fim das penas alternativas e da permissão do porte de arma para todo cidadão. A figura expressiva deste segmento é o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), capitão da reserva do Exército. Bolsonaro, que exerce o sétimo mandato na Câmara, ganhou notoriedade após dar declarações sobre questões polêmicas, como homofobia, preconceito racial, sexismo, cotas raciais e defesa da tortura e do regime militar no Brasil, sendo classificado como representante da extrema-direita brasileira.  Outra polêmica envolvendo o deputado foi no episódio de confronto com a deputada Maria do Rosário (PT/RGS). “ Há poucos dias, tu me chamou de estuprador, no Salão Verde, e eu falei que não estuprava você porque você não merece” disse Bolsonaro.

Portanto, são esses os deputados federais, maioria na Câmara, que têm o poder de decisão dos rumos político, social e econômico do País. São eles, os responsáveis a rasgar a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) e a Constituição Brasileira de 1988.

Sérgio Corrêa - Jornalista


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