A educação desenvolve as faculdades, mas não as cria.

Voltaire

A negociação está muito dura. O sindicato patronal da educação básica quer impor à nossa Convenção a reforma trabalhista ditada pelo “mercado”. Eles se negam a negociar e afirmam que, se não assinarmos nada, fica valendo a aplicação da CLT, ou melhor, o que sobrou dela. Entenda-se por mercado, os banqueiros, os empresários da indústria e do agronegócio, os rentistas, as igrejas capitalistas, as empresas multinacionais e até governos de outros países.

A dificuldade em negociar acontece porque essas forças de coalizão do mercado, que já são muito poderosas, estão no poder após derrubar um governo legitimamente eleito e conseguirem eleger bancadas inteiras no Congresso que cuidam de seus interesses. Assim, temos várias: da bala, do boi e, inclusive, a bancada da educação privada (dos donos das escolas particulares), etc. São parlamentares sem nenhum compromisso com o País e com o interesse público. Na verdade, o compromisso deles é saldar seus débitos com as empresas que patrocinaram suas campanhas eleitorais.

Não se trata apenas de garantir lucros e benefícios junto ao Estado, como desonerações e programas de refinanciamento de dívidas das empresas a taxas diminutas e prazos a perder de vista. O projeto é: a financeirização do Estado, que significa tornar a demanda do mercado parte do orçamento da União. Hoje, quase 50% do orçamento público são destinados a pagar rentistas, através dos juros da dívida pública.

Com as “reformas”, os empresários pretendem enfim, modificar a configuração da economia e reorganizar os fluxos de distribuição da riqueza gerada pelo trabalho. Os interesses da nação, o bem-estar das pessoas, a cidadania, o ensino público e gratuito, a saúde pública e os programas de redução da pobreza, perspectivas do processo de redemocratização do país durante a década de 1980, traduzidas pela campanha das “Diretas Já”, incorporadas na Constituição de 1988, e consolidadas em parte pelos governos Lula-Dilma, são duros entraves para a acumulação financeira e rentista. .

Isso já explica o elevado número de programas sociais e direitos trabalhistas retirados pela coalização do mercado que governa o país, tendo à frente Michel Temer. A Previdência Pública, como já prometeram os seus interlocutores no governo, será a próxima a dar lugar para aumentar o filão do mercado no orçamento público e estimular os assalariados a ingressarem na caríssima previdência privada.

Assim, o país se encontra entregue ao ultraliberalismo, não havendo praticamente espaços de negociação. Reflexo disso é a nossa sociedade polarizada e, consequentemente, sem espaços de mediação dos contrários, nem tampouco para discussão. A própria condenação de Lula é controversa, gera estados de opiniões completamente contrários, pois não é amparada em provas materiais, não tendo sido respeitado o devido processo legal, segundo muitos juristas.

Foi uma condenação sintomática e justificável para os dias que vivemos, pois o ex-presidente é um dos últimos, se não o único, político a abrir espaços democráticos de negociação entre as diversas forças da sociedade. Gostar ou não do Lula pouco importa, mas não se pode negar a ele o direito de ser candidato. Do mesmo modo, não se pode negar aos professores o direito ao trabalho digno, sem a tutela do mercado.

Esse é um momento que exige da sociedade mais do que convicções.

Parafraseando Voltaire, precisamos desenvolver nossas faculdades em defesa do diálogo e do respeito, nos libertando para conter quem hoje nos aprisiona.

Nelson Bertarello – Diretor de Comunicação do Sinpro ABC